sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

FHC fugiu do Amaury




Na nota em que ” toma satisfações do Amaury”, o Farol de Alexandria pede Justica e se diz vitima de uma “infâmia”.

Ou seja, ele fugiu do Amaury.

O Codigo Penal preve três crimes contra a honra.

Injúria, artigo 137, é atribuir uma qualidade negativa a alguem: Zezinho é muito feio.

Calúnia, artigo 138, consiste em atribur um crime a alguém: Zezinho roubou a minha bicicleta.

Difamação, artigo 139, consiste em ofender a reputação: Zezinho só vai trabalhar embriagado.

“Infâmia” é literatura.

Nao é crime.

Ninguém pode exigir Justiça para reparar uma infâmia.

Por que o Farol acusa o Amaury de infamante?

Porque isso não tem consequência jurídica.

Tem o mesmo valor de chamar o Amaury de vesgo.

O Farol jogou para a plateia.

Para os parvos.

O Farol, o Cerra ou qualquer ilustre membro de sua clã precisa pensar duas vezes antes de processar o Amaury.

O Ricardo Sérgio fez essa besteira, leviu uma “exceção da verdade” pela lata e deu no que deu.

FHC mostrou-se indignado, pediu Justiça e foi embora para a Europa – e o Cerra que se vire.

O Farol deve ter consultado um criminalista de escola, como seu Ministro da Justiça, José Carlos Dias, advogado de Cerra.

E o Dias sabe que infâmia é como uma nuvem.

Escurece e vai embora.

Paulo Henrique Amorim

sábado, 10 de dezembro de 2011

O “D” de PSDB quer mesmo dizer Democracia?


ação de Aécio Neves e FHC quando souberam da pergunta-título desde artigo

Por Ana Helena Tavares(*)

Já não está mais aqui o velho timoneiro que também criou um partido com “D” na sigla e dava a essa letrinha o seguinte sentido: “A grande força da democracia é confessar-se falível de imperfeição e impureza, o que não acontece com os sistemas totalitários, que se autopromovem em perfeitos e oniscientes para que sejam irresponsáveis e onipotentes.” (Ulysses Guimarães)

Se já nenhum ser humano é infalível, imaginem no jogo político, reforçado pela numerosa parcela medíocre da imprensa que se vende a ele, onde há palanques até embaixo de tapetes. Não há altares de pureza.

De limpa já basta a raça com que Hitler sonhava – e que parte do mundo ainda quer tornar realidade. É um jogo de causar inveja ao mais maquiavélico jogador de pôquer. RM (o todo-poderoso da Globo) entendia dos dois jogos. FHC lecionou sobre Maquiavel.

JS, aluno tardio e arredio, não aprendeu grande coisa. Principalmente, não aprendeu a reconhecer seus próprios erros. Coisa que não poderia mesmo aprender com FHC.

Por que, com todos os defeitos que possa ter tido, nossa Constituinte foi um avanço democrático? Porque é preciso reconhecer-se imperfeito para avançar. Naquele momento, os congressistas sentiam-se derrotados por 20 anos de ditadura. E só assim foi possível começar de novo.

Quando JS e FHC reconhecerão que foram derrotados? Não por Dilma, nem por Lula, nem pelo PT, mas por seus próprios aliados e, pior, por seus próprios egos. JS mantém um Twitter tragicômico. FHC escreve artigos que ninguém de bom senso consegue ler.

É assombrosa a miudeza de pensamento deles. Não fazem política. Fazem futrica.

É nítida a sede de poder, vazia de sustentação. A eterna ânsia de tapetão.

Isso não é bom para o Brasil.

O que o PSDB fez ao pedir a cassação do registro de Dilma, quando ela contava com mais de 50% dos votos na eleição de 2010, senão a irresponsabilidade de tentar ganhar na marra, achando-se onipotente, “cavalo puro sangue”, na (ingênua) tentativa de aniquilar a concorrência?

E por que perderam mesmo com a metralhadora da mídia apontada unicamente contra o PT? Porque o T de PT quer mesmo dizer Trabalhadores. Negar isso é negar que milhões de pessoas foram tiradas da miséria, fato que o mundo inteiro reconhece.

Ah, o Brasil ainda tem muitos problemas… A educação de base é das piores do mundo. Ok. Vocês não acham possível mudar em 9 anos um país explorado por 5 séculos, não é?

Membros da alta cúpula petista enriqueceram? Sim. Se foi dentro da lei, e daí? Que moralismo de bordel é esse onde político não pode enriquecer, mas todo mundo acha normal a fortuna de Steve Jobs e Eike Batista? Quem vocês acham que corrompe os políticos senão os grandes empresários? Se o enriquecemento não foi lícito, é caso de polícia. É assunto para o Ministério Público e para a Justiça.

Como também deveria ser o recém lançado livro “A privataria tucana”, do premiado jornalista Amaury Ribeiro Jr.

Dizem que o “B” de PSDB refere-se a Brasil. Vender o patrimônio público e enriquecer em cima disso é ser brasileiro onde, quando, como?

A roubalheira durante as privatizações foi fortíssima. O teor do livro seria para colocar na cadeia JS, FHC e RT (o dono da bola, homem com o corpo mais fechado do Brasil). É vergonhoso, escandaloso, indecoroso, o silêncio sepulcral da mídia e o do judiciário.

Hoje, quem for à banca de jornal, presenciará uma guerra de capas. A da revista Carta Capital anuncia o livro bombástico. Mas engana-se quem acha que Veja o ignora. A revista(?) da Editora Abril passa recibo, tentando desqualificar as denúncias.

A diferença? É que o trabalho bem apurado da Carta Capital só tem voz graças à internet. Já o esgoto da Veja tem efeito cascata na Folha, no Estadão e em todos os veículos comandados pela família de RM (o homem que jogava pôquer com a sociedade).

Nenhum país avança na caminhada democrática tendo uma oposição que, por não conseguir ganhar no voto, se escora na mídia para desestabilizar o governo. Federal. Porque o de SP não passa pela boca da Poeta nem quando a corrupção sai em livro.

Vai daí que a corrupção só vai acabar quando ela parar de ser investigada e punida de forma seletiva. Quando a regulamentação da mídia garantir acesso à informação a todos os brasileiros. Quando houver uma reforma séria no judiciário. Quando houver uma reforma séria na política.

Quando tudo isso acontecer afetará a vida de todos, principalmente a da elite, por detrás de seus vidros fumê. De onde não ouve o povo. Nem o vê.

Quando afirmei, no início deste texto, que JS e FHC foram derrotados por seus próprios aliados não foram palavras gratuitas. O jornalista Amaury Ribeiro Jr. de petista não tem nada – é ligado a AN (diz isso no livro). E tudo indica que foi o neto de Tancredo que, que mandando e desmandando no jornal “O Estado de Minas”, lhe pediu o início das investigações que geraram o livro.

Amaury foi, então, acusado de quebrar o sigilo de diversos tucanos para obter algumas das informações. Sendo verdade, o que JS tem a reclamar se sua filha, através de sua empresa, quebrou uma quantidade infinitamente maior de sigilos para fins bem menos nobres?

Ligado ao PSDB e legítimo representante da privataria, agora denunciada e fartamente documentada em livro, o engenheiro Luiz Carlos Mendonça de Barros, teve amplo espaço na edição de 30 de Agosto de 2010 da revista Época, para se defender do suposto grampo de Amaury dizendo o seguinte absurdo: “quebra de sigilo fiscal guarda a mesma proporção que uma tortura física praticada pela polícia e pelo exército porque se trata de direitos constitucionais do cidadão” (declaração que só pode mesmo vir de quem estava nadando em dinheiro durante a ditadura).

Aí, fica a pergunta: no escândalo do grampo (leia-se quebra de sigilo telefônico) – que levou “Mendonção” (como é conhecido Mendonça de Barros), então presidente do BNDES, ao banco dos réus (sendo absolvido) em ação de improbidade administrativa, e que comprovadamente ocorreu com a condescendência do então Presidente da República FHC – não estavam em jogo “direitos constitucionais do cidadão”?

O que este texto tenta mostrar é que o que distingue um governo de outro não é aquilo que todos chamam hipocritamente de moral, bons costumes, etc e tal, sem, muitas vezes, ter nada disso em casa. A diferença está no projeto político. É isso o que os brasileiros deveriam estar discutindo nos bares (além do futebol, é claro).

Vale ainda frisar que se agora a corrupção aparece tanto, de uma forma como não aparecia antes, é óbvio que é porque ela está sendo combatida de forma democrática e transparente, enquanto outros, com a luxuosa ajuda dos barões da mídia, preferiam engavetá-la.

Reza a lenda que o brasileiro típico “não tem nem um mal nem um bom caráter, simplesmente não o tem”. Só que isso não quer dizer que sejamos manipuláveis. Macunaíma era bem mais esperto do que os leitores da Veja.

Não consigo ver o nosso “herói sem nenhum caráter” acreditando em denúncias sem provas e desprezando um livro bem documentado. Não, ele não cairia nessa.

O que somos é maleáveis ao vento dos interesses. E aí há gente que acredite em tudo, de acordo com o que lhes convém.

E há também quem não possa acreditar nem deixar de acreditar por ser impedido de se informar sobre os acontecimentos. O editor do livro “A privataria tucana” já denunciou ter sido sondado por JS para uma “conversa”.

JS foi líder estudantil numa época em que o Brasil vivia sob um regime que também começa com “D”. Espero que ele não esteja com saudades.

*Ana Helena Tavares é editora do site Quem tem medo da democracia?

domingo, 20 de novembro de 2011

Mauro Santayana: Espanha, entre a direita e a direita

A Espanha, nas eleições de domingo, está entre a direita e a direita. Por mais que o PSOE busque recuperar o discurso, seus porta-vozes de hoje estão afônicos. Mas a Espanha não é um caso isolado. A esquerda está nas ruas, com os indignados do mundo inteiro, mas sem líderes, sem projetos e sem programass.

Nos meses fervilhantes de 1963, que antecederam o golpe militar, eu subia, com os professores de direito e homens públicos Edgard da Matta Machado e Alberto Deodato, a Rua da Bahia, eixo político e social de Belo Horizonte. Deodato, sergipano, que vivia em Minas desde moço, era advogado de latifundiários, assumia a sua posição de direita e convivia, com amabilidade, com pessoas de esquerda, como éramos Edgard e eu. De repente, ele, bem humorado, parou e comentou que contrariava a lógica e a física: como caminhava entre nós dois, estava entre a esquerda e a esquerda.

A Espanha, nas eleições de domingo, está entre a direita e a direita. Por mais que o PSOE busque recuperar o discurso, seus porta-vozes de hoje estão afônicos: os sonhos de Pablo Iglesias, o fundador do socialismo espanhol, foram varridos pela timidez de Zapatero e seu grupo. Mas a Espanha não é um caso isolado. A esquerda está nas ruas, com os indignados do mundo inteiro, mas sem líderes, sem projetos e sem programas. Mesmo que os indignados espanhóis quisessem, não teriam em quem votar. Em seu desconsolo, tanto faz sufragar Rubacalba quanto Rajoy. Por isso mesmo espera-se a vitória do conservador, por ser uma alternativa ao que já se conhece.

O bipartidarismo de fato, que muitos admiram e querem, fecha o passo a terceiras idéias e novas personalidades. Desde a eleição de Felipe González que os socialistas buscam o acomodamento na Espanha. Naquele momento, a tática da moderação era necessária. É de se recordar que, nos debates no Parlamento, para a aprovação do nome do então jovem advogado andaluz como chefe de governo, em outubro de 1982, o chefe de fila da direita, Manuel Fraga Iribarne, comentou que Felipe aparecia na arena como un toro afeitado, ou seja, um touro com os chifres serrados, com discurso apaziguador. Mas Fraga advertiu que fora um touro de chifres aparados que matara o famoso toureiro Manolete em 1947, em Liñares.

Felipe foi um bom governante na garantia das liberdades públicas, mas se manteve tímido na frente econômica, sem avançar sobre os Acordos de Moncloa, negociados pelo seu predecessor Adolfo Suarez. Os endinheirados, que vinham de Franco, mesmo que hajam cedido um pouco, continuaram governando de fato o país, mediante os bancos e as grandes corporações.

Essa falta de ousadia e outros equívocos levaram a direita a tomar o poder, em 1996, com Aznar, saudoso do franquismo e vassalo fiel de Washington. Ele ficou famoso pelo seu atrevimento ao tratar a América Espanhola como nos séculos 16 e 17, quando no auge do Império colonial.

Como é sabido, Aznar chegou a telefonar para o presidente argentino Eduardo Zuhalde, ordenando-lhe, com grosseria, que acatasse as exigências do FMI.

Zapatero começou com algumas esperanças, ao reduzir a submissão a Washington, ao retirar o grosso de suas tropas do Iraque, mas, pouco a pouco, foi aceitando as pressões, internas e externas, associando-se aos banqueiros e às corporações empresariais.

Desviando recursos recebidos da União Européia, financiou a compra de empresas estatais e privatizadas na América Latina – incluído o Brasil – em continuação à política neoliberal da direita. Com isso, ao não usar os recursos no próprio país, contribuiu para a grave crise econômica atual. A um sucedâneo da direita, que era o seu governo, os eleitores indecisos preferem o original, e votam agora em Rajoy. O mesmo fenômeno pode ocorrer na Europa, nos poucos países em que governos de centro e centro esquerda detêm o poder.

Mas muitos dos desiludidos dos partidos tradicionais, que agravaram a situação de desemprego, vão mais à direita e procuram os partidos racistas como alternativa. Há, assim, a rearticulação dos nazistas e fascistas, com seu ódio contra os estrangeiros, como ocorreu há dias na grande manifestação da ultra-direita em Varsóvia. O massacre da Noruega é uma séria advertência que os governantes estão desprezando.
Há, no entanto, duas possibilidades de que o centro-esquerda ganhe os pleitos futuros: a França, desanimada de Sarkozy e de seus crimes na Líbia; e a Alemanha de Angela Merkel, cuja política, ainda que bem sucedida em termos econômicos, dá sinais de fadiga.

por Mauro Santayana, em Carta Maior

sábado, 19 de novembro de 2011

Não acredite em agências de risco. O problema não é a Miriam. É a Globo

A agência de risco americana Standard & Poor’s elevou a nota do Brasil a BBB – ou seja, o risco de o Brasil dar um calote da dívida é minimo.


Foi essa mesma S&P que rebaixou a nota dos Estados Unidos e seu presidente foi devidamente demitido.

O Conversa Afiada não leva nenhuma agência de risco a sério.

Especialmente a S&P.

São agências de chute revestido de ciência, como acontece com os instrumentos da ação do Neolibelismo (*) pelo mundo.

Sobre o cascatômetro das agências de risco, assista, amigo navegante, ao filme Inside Job, Trabalho Interno.

Não fica agência sobre agência.

Mas a Urubóloga, neolibelês (*) por excelência, acredita em agências.

Agências reguladoras (como a Anatel rsrsrsrsr) e de risco.

Hoje, na primeira pagina de O Globo, sabe-se que a colona (**) da referida colonista (***) completa ali 20 anos.

Vinte anos de neolibelismo (*) na veia !

O ansioso blogueiro correu a referida colona (**) para ler sobre o novo reluzente papel do Brasil na S&P.

Nada.

A colona (**) dos Vinte Anos é um exercicio naricisístico sobre a colonista e seu papel testemunhal, decisivo, nos últimos vinte anos de história do Brasil – que, sem ela e a Globo, não seria o mesmo.

O problema não é a Miriam.

O problema é a Globo.

A Globo, que da à Miriam uma exposição que nenhum pensador brasileiro sobre a Economia jamais teve.

Roberto Simonsen, Nelson Werneck Sodre, Mario Henriue Simonsen (para ficar na letra “s”), juntos, jamais terão o poder de penetração e persuasão que a Urubóloga tem num único dia: no Bom (?) Dia e seus gráficos mortíferos (pobre Renata Vasconcelos ! ), na CBN, a radio que troca a noticia, no Globo, no portal Globo.

A Globo também não seria a mesma sem ela.

A Urubóloga dá o substância ideológica ao maior conglomerado de mídia da América Latina.

(O Ali Kamel é o Ratzinger – o guardião da Fé e o Torquemada, o que manda para a fogueira.)

Esse é o problema, ministro Bernardo.

Usar um bem público – o sinal aberto – para disseminar ideologia travestida de Ciência.

A Urubóloga jamais produziu uma única ideia original.

Ela é um “embutido” da Sadia.

Mistura ingredientes conhecidos.

E que, separados, você talvez não ousasse consumir.

Como diria o Malan do Cerra: o que é novo não é bom; o que é bom não é novo.

O problema é a Globo - montada num país cuja ultima Ley de Medios data de 1963, no governo do grande Presidente João Goulart – é a Globo ter o poder que tem.

O problema não é a Miriam.

Porque, na Economia – que não é Ciência – a Urubóloga é um Paulo Coelho: a fama é inversamente proporcional à qualidade.

Paulo Henrique Amorim

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A alma da UDN

A entrevista do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, hoje, no Estadão, deve ser lida abaixo da linha das palavras, na linha de visão de mundo neoliberal que domina a mente vaidosa do “príncipe” destronado.

Ele reage, em parte, aos “conselhos” da professora americana Frances Hagopian, que sugeriu que o PSDB precisa assumir-se como um partido de centro-direita.

A certa altura, ele se expõe:

Não se deve, então, falar em esquerda e direita ?

Há uma insistência nessa dicotomia. Isso se deve à falta de analisar os processos reais, o mundo concreto. Não é que inexista uma esquerda, mas… o que significa a esquerda hoje? Ninguém mais pensa, como no passado, coisas como coletivização dos bens privados, feita por um partido que dominasse o Estado em nome de uma classe. Isso não ocorre mais.

Fernando Henrique, a quem não falta conhecimento teórico para saber disso, tem perfeita compreensão que, há mais de 50 anos, não se pode definir assim o pensamento de esquerda. Ele próprio, quando ainda não havia transitado de lado, era um intelectual de esquerda sem jamais ter defendido a coletivização dos bens privados ou o domínio do Estado por um partido em nome do Estado.

Ser de esquerda – sobretudo aqui e progressivamente, desde os anos Vargas – foi sinônimo de defender um nacionalismo inclusivo que, de um lado, protegesse o país do saque colonial – de riquezas naturais e, mais tarde, financeiro – e, de outro, promovesse o resgate, longe de ser concluído, de imensos contingentes da população de uma condição de miséria.

Seu governo fez exatamente o contrário. Sobre a entrega e abertura das entranhas do país, nem é preciso falar, todos sabem. Sobre a exclusão, alguém duvida do quanto se alargou o fosso entre elite e povão, nesse período. Não, claro, não foi ele quem a inventou. Mas tomou gosto nela, pela sua própria alma deslumbrada e a palavra “moderno” passou a ocupar na sua mente um lugar que eclipsava totalmente a palavra “justo”.

“Quem defende a direita no Brasil? Ninguém. Mas na prática ela existe – mas a nossa direita é muito mais o atraso, o clientelismo, fisiologismo, esse tipo de questão, do que a defesa dos valores intrínsecos da propriedade, da hierarquia”.

Perfeito. Reduzimos, então, a direita no Brasil a alguns políticos sem-vergonhas, nepotistas ou a figuras tristemente folclóricas.

A propriedade e a hierarquia que fazem deste país um dreno de riquezas e de trabalho, em proveito de uma ínfima elite e de uma ordem econômica mundial decrépita são defendidos por quem?

Ah, sim, pelos “modernos”.

“(…) Temos (o PSDB) uma tradição republicana, nos diferenciamos bastante nisso. A coisa pública tem que ser respeitada como tal e não ser objeto nem de apropriação privada nem político-partidária. Isso é uma linha. Não é esquerda nem direita, é republicana”.

Mais uns anos de tal tradição republicana, não sobraria República.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Presidenta, leve o Brasil a Ialta. E leia o Kissinger




“Os líderes não criam o contexto em que operam. Sua contribuição consiste em operar no limite do que uma determinada situação autoriza. Se o líder excede esse limite, ele cai; se fica atrás do limite, provoca a estagnação. Se, porém, constrói de forma consistente, ele pode criar um novo conjunto de relações que vai elevá-lo acima daquele momento histórico, porque todas as partes envolvidas considerarão que aquilo é de seu interesse.”


“On China” , Henry Kissinger, The Penguin Press, New York, 2011, pág. 215.


Essa frase faz parte do capítulo em que Kissinger descreve os passos que levaram à visita de Nixon à China.

Antes, ele tinha descrito de forma impecável a genialidade do diplomata Mao Tsé Tung.

Cercado por quatro gigantes – URSS, Índia, Japão e EUA – , Mao se aliou ao mais forte – EUA – para enfrentar o que mais o ameaçava – URSS.

E isso, quando a China tinha saído da crise da Revolução Cultural, e mergulhava num impasse sucessório, já que o herdeiro-aparente, o Ministro da Guerra, Lin Biao, morreu num suspeito desastre de avião quando fugia para a URSS.

E foi aí que Mao seguiu o que ele próprio pregava: o Grande Timoneiro navega a favor da corrente. E, não, contra.

A Presidenta Dilma Rousseff tem diante de si o momento de assumir um papel que transforme a liderança do Brasil em beneficio para todas as partes.

A hora não poderia ser melhor.

O Brasil vai sair da crise econômica mais forte.

Como na crise de 2008, o desempenho do Brasil será exemplar.

As potências de antanho – aquelas que servem de bússola aos neolibelês (*) – sairão da crise enfraquecidas.

Dos BRICs, o Brasil é o único país ocidental.

Está ao lado da África – onde se trava, hoje, uma parte significativa da batalha pelo domínio econômico, amanhã.

O Brasil, como os Estados Unidos, será, breve, do Atlântico e do Pacífico.

O Brasil tem essa formidável Classe C, invenção do Nunca Dantes, que desconcerta os Neolibelês, e funciona como um arsenal dissuasivo, atômico.

O único defeito, ao se comparar com os outros dos BRICs, é que o Brasil não tem (ainda) bomba atômica.

(Por obra e graça de dois desastrados presidentes – Collor e seu discípulo, FHC.)

Nesta crise corrente, a Presidente já mostrou as garras.

Não vai pagar pela crise dos Estados Unidos e da Europa – dois relapsos.

Quer estar na mesa da Reconstrução.

No novo Bretton Woods.

E vai jogar pesado nos organismos internacionais – ONU, FMI, G20.

Dilma pode ser a timoneira do Brasil na nova Ialta .

Há algumas pré-condições.

Contornar a furiosa resistência da elite brasileira, que se materializa no PiG (**) e na formação PSDB-DEMOS.

São os colonizados, os vira-latas, que querem ainda um Brasil de 20 milhões, e o resto trancado numa Soweto.

Eles são poucos.

Mas ladram e mordem.

Como enfrentá-los ?

Não será com o Paulo Bernardo.

Esses colonizados querem que o Brasil fique encarcerado na discussão da “meta inflacionária” e da pesquisa Focus, o “mercado”.

E fazer como o PSDB, que, rabo de fora – sobre os novos anões do orçamento – só fala em corrupção.

Essa é a turma ancorada em 1964, quando derrubou Jango com a mão dos americanos.

E em 1994, quando o brasileiro votaria num poste, desde que a inflação acabasse.

Votou em FHC.

A Presidenta também terá que superar o legado do Nunca Dantes.

A agenda social está posta.

O Brasil sem Miséria será cumprido.

O Nunca Dantes manteve a Petrobras no Brasil – não entregou à Chevron, como fariam o Farol e o Cerra.

O Nunca Dantes criou o maior programa de intervenção social em atividade no mundo – o Bolsa Família – e deu um prato de comida, educação e vacina a milhões de famílias brasileiras.

E o Nunca Dantes inventou a Classe C.

(Esta frase tem o objetivo de irritar os tucanos e seus trombones no PiG (**) – o Lula inventou a Classe C ! )

Agora, a tarefa da Presidenta é seguir adiante.

O passo à frente.

Empurrar o barco na direção da corrente.

Levar Brasil a Ialta.

À África.

América Latina.

Deixa a Colômbia fazer um acordo de livre comércio com o Obama.

O amigo navegante sabia que a fuga de mexicanos para os Estados Unidos, em busca de emprego, caiu a zero, segundo entrevista do presidente Calderon ao New York Times ?

A Colômbia precisa mais do Brasil do que dos Estados Unidos.

A Hillary disse que os Estados Unidos deveriam imitar o Brasil e colocar a Economia acima da Diplomacia.

Tai.

Uma boa ideia.

Botar o Patriota, tão discreto, tão more of the same, sob as ordens do Mantega.

O Mantega, sim, fala grosso lá no FMI e no G20.

Botar o Patriota para fazer fonoaudiologia com o Mantega.

O Kissinger descreve o Mao com a ajuda de uma lenda chinesa.

Tinha dois sábios que viviam atras da montanha.

O Sábio Neolibelês (essa é uma contribuição à narrativa chinesa secular, modestamente …) e o Sábio Idiota.

Os habitantes do vilarejo não conseguiam ampliar a área de cultivo, porque a montanha os emparedava no vale apertado.

O sábio idiota propôs que ele e os filhos começassem a cavar a montanha.

O sábio neolibelês caiu na gargalhada: vocês jamais vão conseguir remover a montanha.

Os sábio idiota e os filhos, mesmo assim, começaram a cavar.

Depois deles, os filhos e netos.

Depois, os filhos e netos.

E o vale se ampliou – sem a montanha.

Este ansioso blogueiro desconfia que a Presidenta simpatize com o sábio idiota.


Paulo Henrique Amorim

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Que tal entregar a saúde pública à Igreja Católica?

O reitor do Santuário Nacional de Aparecida pediu ao ministro da Saúde que não distribua camisinhas nas escolas públicas, afirma o Painel da Folha de S. Paulo de hoje.

Sabedoria divina que arrepia. Até porque, como todos sabemos, jovens só fazem sexo por causa do preservativo grátis. Sim, ela, a camisinha, é a responsável por tirar da inocência milhões todos os anos. Sem a dita, viveriam uma vida de castidade, dedicada às boas causas. Mas não! Enquanto o pecado em forma de látex lubrificado estiver à espreita de nossos adolescentes, feito o Tranca-Rua, o Tinhoso, o Cramulhão mangando Jesus no deserto, não haverá paz.

E o Estado, ao distribuir essas sementes da luxúria, é como a serpente que ofereceu o fruto da árvore proibida à Eva, levando ao conhecimento do bem e do mal. Pobre Adão! Pobres rapazes tirados da castidade por culpa de garotas que repetem o pecado original!

Sem esquecer dos padres acusados de molestar sexualmente de crianças, levados à tentação por conta de anúncios libidinosos de preservativos.

Malditas sejam todas as camisinhas! Antes delas, não havia sexo antes do casamento, muito menos cópula que não fosse com o sagrado intuito da procriação.

Com base no doce raciocínio do clérigo, proponho algo revolucionário: fechar as fábricas de preservativos. Jontex, Olla, Preserv, Blowtex… Isso acabaria com todas as doenças sexualmente transmissíveis, como a Aids, noves fora os filhos indesejáveis.

Enfim, vamos entregar a questão da saúde pública aos cuidados da Igreja Católica. Certamente, ela terá a coragem de pôr em prática ações que o Estado não toma. Os problemas sociais serão resolvidos com base no Código de Direito Canônico e, por que não, na reedição da bula Cum ad nihil magis, do Santo Ofício. Por exemplo, condenar médicos que fizerem abortos, mesmo que nos raros casos previstos em lei, a uma eternidade de privações no limbo – já que não se fazem mais fogueiras em praças públicas como antigamente – vai por um ponto final na questão.

Revolucionário, nesse sentido, foi o então arcebispo de Olinda e Recife José Cardoso Sobrinho, que excomungou os médicos envolvidos no aborto legal feito por uma menina de nove anos, 1,36 m e 33 quilos, grávida de gêmeos do padrastro que a estuprava desde os seis anos de idade.

“Os adultos, quem aprovou, quem realizou esse aborto, incorreu na excomunhão. A Igreja não costuma comunicar isso. Agora, a gente espera que essa pessoa, em momentos de reflexão, não espere a hora da morte para se arrepender”, disse em 2009. Amém.

O mesmo vale para o uso – e, quiçá – distribuição gratuita de preservativos. O arcebispo da Paraíba, Aldo Pagotto, suspendeu o deputado federal e padre Luiz Couto (PT-PB) de suas funções como sacerdote porque ele defendeu o uso da camisinha e os homossexuais.

Enfim, tudo isso seria engraçado, apenas fait divers em colunas de jornais se, em épocas de eleições, os candidatos não vendessem sua alma à igreja na busca por votos, prometendo em troca a manutenção do controle simbólico sobre o corpo dos cidadãos.

por Leonardo Sakamoto, em seu blog

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Gilson Caroni: Nova passeata da Globo, a ressaca dos cansados

por Gilson Caroni Filho

Os brasileiros, que tiveram de passar 20 anos, lendo nas entrelinhas, especulando a partir de meias palavras ou interpretando – procurando interpretar – as rudes reações viscerais trazidas ao público por aqueles que detinham o poder, têm hoje olhos e ouvidos apuradíssimos para entender o que há por trás de cada episódio do cotidiano, por mais irrelevante que possa parecer à primeira vista. É isso que o baronato midiático parece não ter entendido ao continuar patrocinando atos que, a pretexto de combater a corrupção, têm como objetivo esvaziar a política.

Os movimentos que saem da internet para ganhar as ruas, longe de ser a “primavera” com que sonham – ou fingem sonhar – seus reais mentores, têm se mostrado um melancólico outono dos tradicionais dispositivos de agenciamento midiático. Submersos na crise do imobilismo de suas bases, resta à velha direita o consolo de platitudes publicadas para justificar mais uma tentativa fracassada.

O saldo de mais um insucesso ora é debitado à boa situação da economia brasileira ora a uma estranha lógica binária, como a apresentada pelo professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo (USP), Renato Janine Ribeiro, na edição de 13/ 05, de O Globo: “O problema na luta contra a corrupção é que ela está tomada pelos partidos. E é uma lástima que as pessoas usem isso contra o partido oposto”.

Mas a que se refere o renomado acadêmico? A característica do movimento não seria exatamente o seu reiterado “caráter apartidário”? Ou, sem se dar conta, Janine revela o fato que deveria permanecer oculto: o centro político da reação está agrupado no campo jornalístico oligopolista que assume para si o papel de partido de oposição.

O mesmo partido que deu sustentação a duas décadas de ditadura militar. O mesmo agrupamento que silenciou as emoções e expectativas da opinião pública durante os oito anos de desmando do tucanato. Que editou a realidade para ocultar as preocupações da população com o apagão, o descontrole cambial, a desnacionalização de partes substanciosas da produção e serviços nacionais, os rigores de uma política econômica que duplicaram as dívidas externas e internas e criaram seguidos déficits comerciais.

Desemprego, congelamento ou irrisórios aumentos salariais, ao lado de escândalos políticos e econômicos, pareciam fazer parte do cenário natural para os mesmos colunistas militantes que agora se arvoram em defensores de valores republicanos. Num conhecido jogo de espelhos, a defesa incondicional dos ditames do mercado é trocada, editorialmente, pela busca de posicionamento ético no trato da coisa pública. A guinada é tão mal-feita que não atrai o distinto público, como pudemos constatar nas manifestações de quarta-feira, dia da padroeira oficial do Brasil. No Rio de Janeiro, os manifestantes chegaram a hostilizar os que preferiram olhar o mar a ver a ressaca dos derrotados.

Para deixar claro qual o objetivo da TV Globo e de seus sócios menores nessa simulação barata, vale a pena reproduzir o que escreveu o ex-deputado Milton Temer (PSOL) em seu blog: “promover no Brasil uma onda semelhante à que lamentavelmente varre povos de potências capitalistas, que se reúnem em manifestações pontuais e conjunturais, mas que, pela abstenção nos processos eleitorais, por justificado ceticismo, permitem à direita mais reacionária manter o controle absoluto das instituições, ditas republicanas, que realmente deliberam sobre seus destinos, através do modelo de sociedade que desenham com suas leis e decisões dos poderes Executivo e Judiciário”.

O brasileiro sabe que, sempre que uma esperança se frustra (o que não é o caso do atual do governo), vem a decepção e é preciso criar alternativas. Sempre é preciso reconstruir caminhos, mas o que a grande imprensa apresenta é um atalho para o precipício.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Zizek: o casamento entre democracia e capitalismo acabou

O filósofo e escritor esloveno Slavoj Zizek visitou a acampamento do movimento Ocupar Wall Street, no parque Zuccotti, em Nova York e falou aos manifestantes. “Estamos testemunhando como o sistema está se autodestruindo. "Quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou". Leia a íntegra do pronunciamento de Zizek.

Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.

Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está se transformando num pesadelo. Não estamos destruindo coisa alguma. Estamos apenas testemunhando como o sistema está se autodestruindo.

Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o fato de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto que estamos fazendo aqui.

Estamos a dizer aos rapazes de Wall Street: “hey, olhem para baixo!”

Em abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.

Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?

Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”

É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: dando tinta vermelha a todos nós.

Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.

Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?

Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão trabalhando para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura.

Vão tentar transformar isso num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremos ele de volta.

Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.

A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os meios de comunicação. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.

Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.

O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.

Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado

Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Essa é a mais valia

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Na estrada da crise

Filme Cruzando as Crises norte-americanas traz a história de jovens que rodaram os EUA em meio às turbulências financeiras

Por: Jefferson Pinheiro, do Coletivo Catarse

Fonte: Brasil de Fato

Um filme de estrada, sobre um país que se despedaça. Com um carro emprestado, um casal de jovens (ele estadunidense, ela brasileira) percorreu 17 mil quilômetros pelos Estados Unidos, em duas viagens. A primeira, quando estourou a crise de 2008. A segunda, um ano após a eleição de Obama. Os dois se jogaram nas ruas para ouvir o que na rua estavam sentindo, pensando, dizendo e fazendo. Um filme de depoimentos impactantes de gente do povo. Com a palavra: latinos, negros, brancos pobres e indígenas. Um registro documental contundente que desmancha a ideia que temos (ou tínhamos) do país considerado a maior potência mundial. Um lugar que está se quebrando, onde a parte mais vulnerável da sociedade tenta juntar seus cacos. “Somos a cidade mais segregada, com a taxa de crimes mais alta. Detroit é o que é por causa da indústria, do capitalismo e da democracia. Somos o fracasso de tudo isto. É o que nos resta”, lamenta o jovem negro Jon Blount, no começo do filme, sob uma cidade desolada.

Cruzando as crises norte-americanas é uma colagem de rostos, falas, lugares e situações que dão uma ideia do panorama geral. Sob a aparente segurança da economia mais forte, o caos vai entrando na vida de muita gente. Na tela, a animação gráfica percorre o trajeto no mapa que os diretores fazem nas ruas. De Rosebud a Denver e, depois, a Salt Lake City. E, assim, o território vai sendo visitado, mostrado, escutado, auscultado. Se fundem o olhar de Mike, de dentro, com o olhar de Silvia, de fora.

O documentário também foi dividido em duas partes que se completam. Na primeira, Colapso, a pior crise financeira dos Estados Unidos desde a Grande Depressão é apresentada nas notícias das TVs, jornais e rádios que escancaram o caos e se misturam com as imagens da estrada, pulando de cidade em cidade, estado em estado. Muitas vezes, da janela do carro os olhos da câmera captam paisagens áridas, degradadas, desertas, fantasmagóricas. A crise é ouvida nas falas de desilusão e desesperança, de quem perdeu o trabalho e a crença nos governos.

Na segunda parte, Ação, acompanha o que associações, Ongs, cooperativas e pessoas estão tentando reconstruir, conquistar através de mobilizações, passeatas, manifestações, greves, embates, articulações. É nesta parte que a luta da população vai sendo apresentada pelo que assegura a Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas que não é cumprido: não há saúde, educação, moradia e vida com dignidade para todas, para todos. Cruzando as crises é, essencialmente, um documentário sobre pessoas. E elas estão o tempo todo se sucedendo na tela: trabalhadores, ativistas, desempregados, estudantes, moradores de rua, sindicalistas, professores.

Até onde se pode confundir um governo com seu povo, tanto lá quanto em qualquer lugar? Parece que os estadunidenses estão descobrindo na própria carne, parte da dor que sua pátria já distribuiu em tantas outras geografias. “Não temos uma cultura social, temos uma cultura econômica, que não é sustentável. Talvez, todo este país esteja bêbado, e estamos começando a acordar com as conseqüências. Se a economia entrar em colapso, quem sabe vamos descobrir o valor das relações humanas”, reflete Michael Combs, um senhor de barbas brancas e chapéu furado, cantor de rua, escorado na parede de uma calçada em Santa Fé, Novo México. Antes de tudo, o filme é sobre esta crise de valores alienante, acachapante, que agora sacode os cidadãos. Como em Baltimore, onde trabalhadores mobilizados estão tentando criar uma “zona de direitos humanos”, onde finalmente estes sejam respeitados.

Parece contraditório que o país imperialista, que há décadas liderava sozinho a economia mundial, deixe seus próprios filhos na mão? Não é. Michael Moore nos seus filmes já revelou estas contradições e injustiças, mostrando o quão ridícula é, muitas vezes, sua sociedade e perverso seu sistema econômico, a lógica desse mercado selvagem que move o Estado yankee em declínio.

Agora, que muitas mentiras que alienaram quase uma sociedade inteira desmoronam, vem este golpe na autoestima, na arrogância e na onipotência. Gente que se diz cansada de ser tratada como lixo. Mas refletem os norte-americanos à custa da opressão de quem e em quais lugares conseguiram viver durante tanto tempo em altos níveis econômicos? Para isso não há perguntas nem respostas claras no filme. No entanto, para recuperar sua condição econômica, os mais pobres não miram outras riquezas que não as do próprio país: 10% da população é dona de 70% da riqueza total. Reivindicam redistribuir.



Incluindo-se nos excluídos

Mesmo que não chegue a ser didático, é um fi lme informativo, militante. Um grito de parte dos estadunidenses se incluindo entre os excluídos do mundo. São 43 milhões de pobres e 47 milhões sem seguro médico, que provavelmente não receberão atendimento se adoecerem. Desde o início da crise, em 2008, oito milhões de pessoas já perderam suas casas, por conta das hipotecas. Atualmente, apenas 53% das crianças negras terminam a escola. Na Califórnia, nos últimos 20 anos foram abertas 24 novas prisões e apenas uma universidade. É uma fábrica de prisões privadas, que serve para ganhar dinheiro com as pessoas que o próprio sistema exclui. Um em cada nove negros está preso nos Estados Unidos. No estado de Nova Iorque, dos encarcerados em seus 70 presídios, 80% são negros e latinos. “Enquanto estão resgatando as instituições financeiras, seguem encerrando comunidades pobres e negras em celas exóticas.

Exigimos liberdade para respirar!”, se impõe uma garota num parque em Oakland, enquanto alguns estudos falam na volta da escravidão.

“Resgataram os bancos! E nos venderam!”, denunciam os cartazes numa manifestação. “Não podem usar nosso dinheiro para nos oprimir”, alguém fala ao microfone. Passadas a euforia e a esperança no governo de Obama, a população tem a sensação de “mais do mesmo”. Para o casal que dirigiu o filme, a classe trabalhadora, os pobres e as minorias estão piores do que nunca e a indignação diante da crise econômica desastrosa é resultado de um caos gerado por um sistema de desigualdades. “As soluções não vão vir desde cima. As soluções para cruzar as crises estadunidenses estão nas mãos do povo”, constatam Mike e Silvia, diante da própria câmera. É o que enxerga também o líder comunitário Manuel Criollo: “É o povo que sustenta esse sistema”, lembrando que as pessoas organizadas podem ser as protagonistas das mudanças.

Não é uma tarefa simples a de colocar tanta gente e tantas situações para compor este outro retrato dos Estados Unidos e seu povo, mas por fim, é mesmo esta diversidade fragmentada que nos dá a oportunidade de compreender parte do que se passa por lá. E pensar nos erros que outras nações podem cometer, quando têm este país como referência. Em Porto Alegre, quando a produção foi exibida em junho, Alexandro, um cubano que passava por intercâmbio na cidade, repetia após a sessão que o fi lme precisava ser visto em Cuba, por todos. Desfazer mitos. Colocar a verdade no seu lugar. Por aqui também.

Num viaduto da capital gaúcha, há muitos anos se renova uma inscrição lembrando um pensamento de Mao: “O imperialismo é um tigre de papel”. Sempre achei esta frase um tanto ingênua, muito mais um desejo do que realidade. Mas este filme nos mostra sua fragilidade latente. Neste momento em que há tantas revoltas populares em ebulição e o capitalismo parece entrar novamente numa encruzilhada, mesmo que não seja de papel, o império outra vez expõe seus rasgos, dá sinais de que um dia pode e deve se desmanchar.