quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Ser de esquerda na era neoliberal

Por Emir Sader, no sítio Carta Maior:

Um instituto que fez a pesquisa e os editorialistas da velha mídia se enroscaram nos seus resultados, sem entender o seu significado. Afinal, se a maioria dos brasileiros é de direita – parte que vota na Dilma e parte que vota na oposição - porque a direita tem perdido sempre e continuará a perder as eleições? Por que os políticos mais populares do pais são Lula e Dilma e os mais impopulares FHC e Serra?

Uma primeira interpretação, apressada, é que se trataria de um governo de direita, daí receber o voto de setores que se dizem de direita. O país viveria um êxtase direitista, em que governo e oposição não se diferenciariam, ambos de direita. Tese tão a gosto da ultraesquerda e de setores da direita, ambos adeptos da tese de que o PT apenas repete o que os tucanos fizeram.

Tese absurda, porque já ninguém pode negar que o Brasil mudou, mudou muito e mudou para melhor depois dos governos tucanos e nos governos petistas. Como ninguém nega o destino contraposto que o povo reservou para o Lula e para o FHC, como consequência das mudanças entre um governo e outro.

Para complementar, a direita tradicional – midiática, partidária, empresarial – sempre esteve fortemente alinhada com o governo tucano e contra os governos petistas. Enquanto este sempre teve o apoio dos setores populares, de esquerda, de dentro e de fora do país – neste espectro, de Cuba a Uruguai, da Venezuela ao Equador, da Argentina à Bolívia. E, como corolário, a oposição dos EUA e das forças neoliberais no continente e no mundo. Estes buscando, inocuamente, projetar o México – o grande modelo neoliberal remanescente – como referencia alternativa à liderança brasileira no continente.

Afora o bizarro argumento de que todos estão equivocados e que o Brasil de hoje é igual ao dos anos 1990, de que os lideres esquerdistas não conhecem o país ou outro desse calibre, uma das características da polarização contemporânea se dá em torno do traje que veste o capitalismo na época histórica atual.

O anti-capitalismo, que sempre caracterizou a esquerda, ao longo o tempo, foi assumindo formas distintas, conforme o próprio capitalismo foi se transformando, de um modelo a outro. A esquerda foi antifascista nos anos 1920 e 1930, foi adepta do Estado de bem-estar social e do nacionalismo nas décadas do segundo pos-guerra, foi democrática nos países de ditadura militar. Assim como a direita foi mudando sua roupagem, na mesma medida: foi fascista, foi liberal, foi adepta da Doutrina de Segurança Nacional, conforme as configurações históricas que teve que enfrentar.

Na era neoliberal, os eixos centrais dos debates e das polarizações se alteraram significativamente. A direita impôs seu modelo liberal renascido, marcado pela centralidade do mercado, do livre comercio, da precarização das relações de trabalho, do capital financeiro como hegemônico, do consumidor. Ao mesmo tempo da desqualificação das funções reguladores do Estado, das politicas redistributivas, da politica, dos partidos, dos direitos da cidadania.

É nesse marco que a América Latina passou, de vítima privilegiada do neoliberalismo, à única região do mundo com governos e políticas posneoliberais, com governos que se propõem concretamente a superação do neoliberalismo. A prioridade das políticas sociais ao invés da ênfase central nos ajustes fiscais. O resgate do Estado como indutor do crescimento econômico e garantia dos direitos sociais no lugar do Estado mínimo e da centralidade do mercado. O privilégio dos projetos de integração regional e do intercâmbio Sul-Sul e não dos Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos. Essas contraposição define os campos da esquerda e da direita realmente existentes na era neoliberal.

Os brasileiros tem se pronunciado, reiteradamente, a favor das prioridades de distribuição de renda, do papel ativo do Estado, das políticas de integração regional e intercâmbio Sul-Sul. Constituiu-se uma nova maioria no país, progressista, que preferiu Lula ao Serra ao Alckmin, Dilma ao Serra, e se encaminha para preferir de novo Dilma ao candidato que se apresente pelas forças conservadoras.

Toda resposta de pesquisa depende da forma como foi formulada a pergunta. E os institutos de pesquisa tem sido useiros e vezeiros na arte de manipulação da opinião pública. Basta recordar que o diretor do mais conhecido deles, jurou que o Lula não elegeria seu sucessor, que o campo estava livre para o retorno tucano com o Serra, e demorou para se autocriticar, diante da realidade que o desmentia.

Na era neoliberal – modelo imposto sobre um brutal retrocesso na correlação de forças mundial e nacional – a linha divisória vem desse modelo, dividindo as forças fundamentais entre neoliberais e antineoliberais – conforme resistam a governos neoliberais – e posneoliberais, quando se empenham na sua superação. 

Em vários períodos históricos houve uma esquerda moderada e uma esquerda radical. A social democracia passou a representar a primeira, os comunistas e forças da extrema esquerda, a segunda. No período histórico atual há, na América Latina, governos posneoliberais moderados – como os do Brasil, da Argentina, do Uruguai – e radicais – como os da Venezuela, da Bolívia, do Equador, sem mencionar o de Cuba. Os primeiros romperam com eixos fundamentais do neoliberalismo – com os enunciados: centralidade do mercado, Estado mínimo, privilégio do ajuste fiscal e dos TLCs com os EUA – avançam na sua superação – centralidade das políticas sociais, do papel do Estado, dos processos de integração regional. Os segundos, além de antineoliberais, se propõem a ser anticapitalistas, e deram passos nessa direção. 

Ser de esquerda hoje é lutar contra a modalidade assumida pelo capitalismo no período histórico contemporâneo, é ser antineoliberal, em qualquer das suas modalidades. A moderação ou a radicalidade estão nas formas de articulação, ou não, entre o antineoliberalismo e o anticapitalismo. Seria demasiado pedir que pesquisas e editoriais imersos no universo neoliberal como seu habitat natural, sem a perspectiva histórica que permite entender o neoliberalismo e o capitalismo como fenômenos históricos precisos e a história como produto de correlações de forças cambiantes , pudessem captar o sentido de ser de esquerda e de direita hoje. São vítimas de clichês que eles mesmos criaram e que os aprisionam.

Enquanto isso, a América Latina, sua direita e suas esquerdas, se enfrentam nas condições concretas e especificas do mundo contemporâneo.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

O que foi possível fazer no momento

Tenho sido questionado por alguns amigos sobre o que penso do leilão do Campo de Libra.
Na minha modesta opinião, o maior problema é que o governo não tem recursos financeiros para iniciar a extração desse petróleo. Na verdade, além da participação da Petrobrás, tem os impostos e os royalties, que totalizam quase 75% do volume arrecadado com o petróleo; além do incremento na economia com a geração de impostos e a criação de empregos neste esse período, isso em investimentos diretos. Indiretamente, os impostos e Royalties também vão incrementar a economia. A comparação feita com a Venezuela pelos grandes meios de comunicação é injusta. Lá o petróleo está a flor da terra, não precisa de grandes investimentos para extraí-los. Além da tecnologia que a Venezuela domina. No Brasil, começamos a investir em pesquisa com o governo do PT, portanto, faz pouco mais de dez anos que aprendemos onde procurar e como extrair esse mineral. Antes, éramos totalmente dependentes da importação. O Brasil precisa investir em refinarias, visto que grande parte das refinarias existentes no País são multinacionais Americanas.  Acho que esse é o próximo passo a ser dado.
 Das empresas que ganharam o Leilão, nenhuma é americana. 01 Holandesa, 01 Francesa, 02 Chinesas e a Petrobrás, abrindo novos mercados e interrompendo a dependência que o Brasil tinha com as empresas americanas, Exxon e Chevron.
Agora, outros países têm interesses a ser defendidos no Brasil, como os países acima citados.  O modelo de partilha, no meu entendimento, foi necessário. Não adianta ter grandes reservas e não ter recursos para extraí-los. No ramo de petróleo ainda estamos engatinhando, devido ao abandono dos governos anteriores, inclusive tentando privatizar a Petrobrás, como foi a caso em que FHC mudou o nome para Petrobrax, com o intuito de internacionalizá-la, para depois vendê-la para uma empresa americana, a Chevron.

 Mesmo a Petrobras tendo mais de 50 anos de existência, os investimentos em pesquisa só aconteceu neste governo.

domingo, 6 de outubro de 2013

Você sabia que ficou mais rico?

Por: Eduardo Guimarães
Durante a primeira década do século XXI, centenas de brasileiras e brasileiros de todas as idades e regiões do país criaram páginas na internet para denunciar que os meios tradicionais de comunicação (jornais, revistas, rádios, televisões e grandes portais de internet) tentam ludibriar a sociedade a fim de fazerem prevalecer suas preferências políticas.
Em boa parte, são pessoas como este que escreve – sem vinculações políticas ou corporativas de qualquer espécie, movidas, apenas, pela indignação com uma dita “grande mídia” que mente, distorce informações, inventa acusações e exalta grupos políticos e econômicos com fins unicamente particulares, ou seja, de forma a obter lucro para os seus controladores.
Trata-se, aqui, de grandes meios de comunicação de massa que cresceram e enriqueceram durante a ditadura militar, que os financiou para que defendessem o saque que os ditadores perpetraram sobre o patrimônio público e ocultasse os crimes de lesa-humanidade que cometeram com a finalidade de fazerem prevalecer aqueles interesses inconfessáveis.
Acima de todos os outros oportunistas despidos de qualquer traço de decência e capazes de vender seu país a quem pague mais estão quatro famílias que o regime ditatorial enriqueceu e que a democracia deixou impunes: Marinho, Frias, Civita e Mesquita são os nomes dos que erigiram uma máfia que roubou e continua roubando a nação enquanto acoberta políticos e empresários desonestos.
Na ânsia de defenderem seus interesses particulares – e sabendo que para manterem o poder discricionário que auferiram ilegitimamente dependem do jogo do poder entre os grupos políticos –, essas famílias adotaram a mentira e o logro como ferramentas.
Apesar de todo esse poder – e de forma quase intuitiva –, no limiar do novo século a maioria dos brasileiros passou a desconfiar da pregação política desses megaempresários do setor de comunicações e a votar de forma oposta à que pregavam. Eis que os brasileiros levaram ao poder um grupo político que aqueles veículos de comunicação demonizavam.
Ao longo da década passada e no início desta, as famílias enriquecidas pela ditadura, valendo-se das imensas quantidades de dinheiro público que lhes foram doadas pelos ditadores, vêm trabalhando com fúria incontida para convencer os brasileiros a votar nos políticos com os quais estabeleceram acordos na última década do século passado, os políticos do PSDB.
Contudo, o grupo político que desafiou e derrotou politicamente esses filhotes da ditadura, grupo esse encabeçado pelo Partido dos Trabalhadores e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente, logrou implantar políticas públicas que melhoraram sobremaneira a vida das populações abandonadas pelos preferidos da mídia e, assim, caíram nas boas graças da nação, o que vem lhes permitindo vencer sucessivas eleições.
As quatro famílias midiáticas e seus satélites, então, decidiram que havia que usar métodos artificiais para apear do poder aquele grupo político desafiador.
Primeiro, tentaram transformá-lo em inventor da corrupção no Brasil. Vendo que a maioria não acreditou, de cerca de um ano para cá as famílias midiáticas mitigaram a gritaria moralista e passaram a apostar na distorção da situação econômica e social do país, crente em seu poder “hipnótico”, com o qual fariam uma nação inteira acreditar que aquele grupo político desafiador a estaria levando à ruína.
O imenso preâmbulo acima serviu para contextualizar as informações que vêm a seguir.
Na última terça-feira, este blogueiro (independente, sem vínculos políticos e que sobrevive de trabalho autônomo no setor privado), vendo mais uma de tantas distorções cotidianas das famílias midiáticas, e movido pela indignação, tomou uma iniciativa: telefonou para um dos veículos das famílias supracitadas apenas para desabafar.
Liguei para Suzana Singer, ombudsman do jornal Folha de São Paulo. Conversei com ela durante quase uma hora. Expus minhas críticas e observações. Relatei parte da conversa aqui, neste espaço.  Na última edição dominical da Folha, em sua coluna semanal naquele veículo, Suzana abordou outro tópico da conversa que tivemos.
Liguei para ela, no último dia 1º, logo após assistir, no site do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entrevista do presidente da instituição, o pesquisador Marcelo Néri, que comentara os dados da última PNAD (2012).
Segundo definição do site do IBGE, que empreende a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), aquele estudo visa obter “informações anuais sobre características demográficas e socioeconômicas da população, como sexo, idade, educação, trabalho e rendimento, e características dos domicílios (…)”.
Pois bem, a última PNAD revelou um dado surpreendente. Tão surpreendente que surpreendeu até a Néri, um dos principais coordenadores da pesquisa: no ano passado, apesar do “pibinho” de 0,9%, o brasileiro ficou muito mais rico – a renda média cresceu 8,9%.
 Antes de ligar para a ombudsman da Folha, fiz alguns comentários no Twitter que reproduzo abaixo.
Em seguida a esses tuítes escritos sob indignação extrema, o telefone toca: é Suzana Singer retornando o recado que deixei em seu escritório. Entre muito que lhe disse ao longo da conversa, comentei os dados altamente positivos da PNAD e a contradição de a pesquisa ter sido abordada tanto na Folha como no resto da mídia sob viés diametralmente oposto.
Em sua coluna deste domingo, a ombudsman abordou a questão. Relata como a mídia transformou uma notícia excelente em um amontoado de péssimas notícias.
Antes de reproduzir a coluna dessa jornalista que, com sua matéria sobre o tema em questão – publicada na Folha de São Paulo de 6 de outubro de 2013 –, ganhou meu respeito, quero cumprimenta-la, pois fez uma pesquisa aprofundada sobre a trapaça que tanto o jornal em que trabalha quanto o resto da “grande mídia” praticaram mais uma vez.
Deixo-o, caro leitor, com a belíssima coluna da ombudsman da Folha, Suzana Singer.
—–
FOLHA DE SÃO PAULO
6 de outubro de 2013
OMBUDSMAN
SUZANA SINGER ombudsman@uol.com.br @folha_ombudsman facebook.com/folha.ombudsman
Arauto das más notícias
Folha destaca apenas dados negativos da Pnad, apesar de a pesquisa ter apontado aumento de renda em 2012
A edição que a Folha fez da pesquisa Pnad, que traça anualmente um quadro social do país, é um prato cheio para quem acha que o jornal só publica más notícias. Todos os destaques pinçados no levantamento eram negativos.
O título na capa informava que “Analfabetismo e desigualdade ficam estagnados no país” (28/9). Em “Cotidiano”, havia o aumento da diferença de renda entre homem e mulher, os salários inchados pela falta de mão de obra especializada e o celular como o único tipo de telefone em mais da metade dos lares. A análise dizia que o resultado da pesquisa pode significar “o fim da década inclusiva”.
Outros jornais optaram por manchetes do tipo uma no cravo outra na ferradura: “Renda média sobe, mas desigualdade para de cair” (“O Globo”), “Analfabetismo para de cair no país; emprego e renda sobem” (“Estado”), “Em todas as regiões houve aumento de renda, mas a desigualdade ficou estagnada” (Jornal Nacional).
Com seu característico catastrofismo, a Folha fez uma leitura míope da pesquisa, que é muito importante pela sua abrangência -são 363 mil entrevistados respondendo sobre escolaridade, trabalho, moradia e acesso a bens de consumo.
O dado mais surpreendente era que a renda do brasileiro cresceu em 2012, ano em que o PIB subiu apenas 0,9%. Na Folha, esse fenômeno só foi citado no meio de uma reportagem sobre a desigualdade.
Coube ao colunista Vinicius Torres Freire, no dia seguinte, chamar a atenção para o fato de que o Brasil estava mais rico “e não sabíamos”. “É possível dizer que a taxa de pobreza deve ter caído bem no ano passado”, escreveu Freire.
Pelos cálculos de Marcelo Neri, 50, presidente do Ipea, 3,5 milhões de brasileiros saltaram a linha de pobreza em 2012. “No conjunto das transformações, foi a melhor Pnad dos últimos 20 anos”, diz Neri.
A desigualdade parou mesmo de cair, mas foi porque os muito ricos (1% da população) ficaram ainda mais ricos (a renda subiu 10,8%), num ritmo mais rápido do que os muitos pobres (10% na base da pirâmide) ficaram menos pobres (ganho de renda de 6,4%). É claro que não se deve desprezar o abismo social, mas não dá para ignorar que houve uma melhora geral no ano passado, o que é um mistério a ser explicado pelos economistas.
Se o jornal subestimou o dado da renda, deu espaço demais para o fato de o analfabetismo ter parado de cair. Teve nesse ponto a companhia dos outros jornais e da TV.
Depois de 15 anos de queda contínua, a taxa de analfabetismo variou de 8,6% para 8,7%. A diferença, irrisória, pode ser apenas uma flutuação estatística. Nem o fato de a taxa ter parado de cair é importante, segundo os especialistas.
Os analfabetos brasileiros concentram-se, principalmente, na faixa etária mais alta (60 anos ou mais). Os mais velhos, que não tiveram acesso à escola na infância, são mais difíceis de serem alfabetizados. “Entre os jovens, a proporção de analfabetos continua caindo. A conclusão é que, embora nossa educação tenha muitos problemas, este não é um deles”, explica Simon Schwartzman, 74, presidente do Iets.
O destaque dado à diferença entre a remuneração de homens e mulheres também foi descabido. Em 2011, a brasileira recebia 73,7% do salário de um homem. No ano passado, era 72,9%.
Além de não ser uma variação muito significativa, pode ser um problema amostral. “As mulheres não estão necessariamente ganhando menos do que os homens. Se elas já têm uma renda média menor, basta crescer a participação feminina no mercado de trabalho para aumentar a diferença entre os sexos”, afirma Marcio Salvato, 44, professor de economia do Ibmec.
Entre os bens de consumo, o jornal destacou o celular e as motos. Wasmália Bivar, 53, presidente do IBGE, ressalta a máquina de lavar roupa, presente em 55% das casas. “Para a vida das famílias mais pobres, é um bem de grande significado, porque dá mais tempo livre para as mulheres.”
Não é fácil escolher o que há de mais relevante em uma pesquisa extensa como a Pnad, mas não dá para adotar o critério dos piores números. O jornalismo deve ter como primeira preocupação o que vai mal, apontar os problemas, só que o necessário viés crítico não pode impedir que se destaque o que é de fato o mais importante.

QUE RENOVAÇÃO É ESSA?

Marina e Eduardo Campos formaram um condomínio político que constitui um enigma da campanha de 2014

No mesmo dia em que a VEJA dava uma contribuição específica ao culto à personalidade de  Marina Silva, dizendo que na véspera ela fora dormir com a esperança de “ter um sonho” que pudesse ajudar a decidir o rumo na campanha presidencial, a líder da Rede  deu provas de que passou os últimos dias acordadíssima.

Numa união destinada a garantir a Marina um espaço na campanha que a Rede não foi capaz de obter, e a Eduardo Campos, uma projeção que ele dificilmente teria como 4º colocado nas pesquisas de intenção de voto, os dois formaram um condomínio político que constitui um enigma da campanha de 2014.

Filiando-se ao PSB, Marina assegurou um palanque para seguir em sua verdadeira prioridade,  cada vez mais semelhante a plataforma básica dos vencidos por Lula e Dilma em 2002, 2006 e 2010: impedir de qualquer maneira e por todos os meios uma quarta  vitória do PT e seus aliados em 2014.

Dramatizando a própria situação, ela chegou a dizer que o Rede era primeiro partido “clandestino” da democratização – afirmação de caráter retórico, que não faz sentido para quem levou a sério a luta clandestina contra o regime militar de 64 e reconhece o valor da democracia conquistada depois.

Vamos combinar: se acredita, de fato, que o Rede foi perseguido por adversários políticos, que teriam boicotado o apoio dos 50 000 eleitores que poderiam ter legalizado seu partido, Marina faria um favor ao país se divulgasse indícios e provas para sustentar o que diz. Sabemos que a Justiça eleitoral abriga cidadãos indicados pelos principais partidos políticos, que devem ser substituídos de 5 em 5 anos. É razoável até imaginar uma imensa  má vontade aqui, outra mais adiante. É assim, no Brasil e em outros países.

Mas é um universo com tantas surpresas e imprevistos que ninguém consegue adivinhar o que acontece sem uma apuração real. No caso mais avançado que conheço até aqui, um advogado do Rede chegou a dizer de forma vaga, para uma repórter, que “certamente” ocorreram boicotes em algumas prefeituras. Onde? Em  Minas Gerais. E agora?

Ironicamente, Marina e Eduardo Campos se comprometeram ontem, justamente, a  enterrar a República Velha e  a renovar os métodos tradicionais da política. Também falaram do esgotamento do nosso sistema como seu maior compromisso político. Mas não disseram com clareza o que pretendem fazer nem como. Até porque estas são verdades tão fáceis de anunciar mas difíceis de explicar.

Quem tem o direito de dizer que o sistema político está esgotado é o eleitor. Ele fez isso em 1984, quando foi as ruas para pedir eleições diretas em pleno regime militar. Como o Congresso rejeitou as diretas naquele ano, o eleitor repetiu a dose cinco anos depois, em 1989, no primeiro pleito em urna após ao regime militar. Destruídos pelos fracassos de sucessivos planos econômicos, os dois herdeiros do governo Sarney não conseguiram somar 6% dos votos. E foi neste cemitério que nasceu Fernando Collor: sem partido, com ideário confuso, vagas promessas moralizantes e absoluto suporte dos meios de comunicação, tornou-se presidente da República. Seu programa era eliminar privilégios e favores do Estado, sintetizados na palavra marajá, usada para definir altos burocratas do serviço público. Parecia uma causa nacional, capaz de unir ricos e pobres, irmanados pelo infortúnio de sustentar privilegiados com dinheiro do contribuinte.

Falar que o sistema político está esgotado, hoje, é enxergar o mundo pelo olhar dos desejos, de quem não aprova determinado governo mas é duvidoso que seja expressão do pensamento do  conjunto da população. É um diagnóstico exagerado, no mínimo,  quando o governo federal tem aprovação superior a 50% e a presidente lidera as pesquisas de opinião com 38% das intenções de voto. Quando seu padrinho, Lula, é o mais popular político brasileiro da história. Quando o PT, alvo indiscutível da “publicidade opressiva” praticada pela maioria dos meios de comunicação na ação penal 470, segue o mais popular partido político do país, com  25 ou mesmo 30% da simpatia dos eleitores.

Quem está esgotada, até agora, é a oposição. Se é possível falar em algo perto de esgotamento, fim de linha, o problema encontra-se aí e é mais localizado. E é tão grave que ela procura alimentar-se, na verdade, de músculos e cérebros extraviados do governo, como Marina e Eduardo Campos.

As ruas de junho deixaram claro que nem  todo mundo pensa a mesma coisa dos nossos políticos. Os milhões de brasileiros que não querem Dilma também recusam personalidades, nomes e ideias que lhes são oferecidas como alternativa. Esses cidadãos Dizem que querem livrar-se de políticos tradicionais quando, na verdade, querem outros políticos – sejam direitistas, revolucionários, reacionários ou simples camelôs ideológicos. Aqueles manifestantes que tinham pontos específicos a reivindicar – como transportes – voltaram para casa depois que a reivindicação foi atendida. Os outros,  permaneceram. Tinham mais a cobrar. Alguns mais quebraram vidros, fizeram provocações. Denunciam o sistema político em nome do fascismo, do anarquismo ou lá o que for.  

Em qualquer caso, e é constrangedor lembrar, Dilma ficou sem aliados em seu empenho para aprovar uma reforma política que, bem ou mal, poderia dar uma resposta à nova situação. Não inventou nada. Apoiou um projeto que reúne o apoio de entidades representativas. Não lembro de qualquer manifestação de apoio dos aliados de Marina Silva. O PSB foi explícito. Divulgou nota a favor das reformas – desde que elas não valessem para 2014.  

O empenho de Marina para falar do “novo” ajuda a encobrir que, entre seus assessores econômicos, encontra-se André Lara Rezende, banqueiro  e profeta da decrescimento econômico, advogado da  teoria primeiro-mundista de que os recursos da Terra se esgotaram e que quem não ficou rico até agora deve desistir até de chegar a classe média baixa. Foi padrinho do Plano Cruzado – que ajudou Sarney a tornar-se imperador do país por um semestre, em 1986  – e do Plano Real, berço de tantas heranças, inclusive da privatização das teles, joia da coroa do governo FHC. Seu homem na Justiça é Gilmar Mendes, capaz de dar dois habeas corpus, em apenas 48 horas, a um dos banqueiros aliados de FHC. Seu maior patrocinador financeiro é a herdeira de um banco  que esteve ao lado de todos, absolutamente todos os governos brasileiros nas ultimas décadas, sem distinção de cor, credo, religião ou traje  – podia ser fardado ou à paisana.

“Novo”?  

Falar da velhice alheia é um dos atalhos mais conhecidos para uma pessoa fingir-se de jovem e seduzir os menos atentos naquela hora da festa em que a maioria dos seres vivos parece parda. Não vamos falar do PSB de Eduardo Campos. O governador  admite que nem estava pensando em termos politicamente geriátricos até a noite de sexta-feira, dedicando-se  a recolher, no laço, quem pudesse reforçar suas fileiras de qualquer maneira. Chegou a trazer para sua casa conservadores notórios, inclusive com ligações diretas com o regime militar. Estranho? Nem um pouco. A política brasileira é feita assim.

O errado é querer tingir o cabelo, fazer uma lipo, tomar um banho de butique e  pensar que ninguém enxerga os sinais da plástica.  Para quem é adversaria assumida das usinas hidroelétricas, é que Marina Silva tenha ingressado no mesmo partido do ex-ministro Roberto Amaral, um dos poucos políticos brasileiros que é partidário declarado de pesquisas nucleares, seja para fins pacíficos, e mesmo para conhecimento da fissão atômica, necessário para a produção de artefatos militares. (Estou 100% de acordo com o ministro nesse ponto).  

Que renovação é essa, meus amigos?

Simples. É a renovação de quem procura um palanque, confunde a  memória e quer nos fazer acreditar que não houve história. Eduardo Campos é um dos melhores políticos de sua geração. Tem luz própria, formação e  capacidade de articulação real.

Mas não vamos esquecer que é produto direto do Brasil envelhecido de repente que agora  denuncia. Talvez seja o grande filhote daquilo que a oposição chama de lulismo. Alimento maior de sua popularidade, o crescimento econômico de Pernambuco,  muito superior a média brasileira, foi irrigado por verbas preferenciais de Brasília, com tanto empenho que levou os conservadores preconceituosos do Sul-Sudeste a denunciar em 2010 o favorecimento “aos nordestinos” por parte de Lula.

A herança política  de Marina é familiar, também. Segundo o Ibope, a segunda opção de 50% de seus eleitores é Dilma.  Em função do receio de explicitar a estes cidadãos  o enorme grau de sua ruptura do Lula, Dilma e o PT, referencias que fazem parte de sua identidade política essencial, na visão de  tantos brasileiros, Marina Silva tem sido  bastante cuidadosa em suas declarações. Evita afirmar, em público, os chavões reacionários, inspirados no golpismo venezuelano, que o conservadorismo nativo utiliza para comparar o Brasil de Lula-Dilma com o país de Chávez-Maduro.

Cada eleitor tem o direito de imaginar que tipo de renovação é essa.


Por: Paulo Moreira Leite na IstoÉ

domingo, 15 de setembro de 2013

25 pérolas de páginas de direita no Facebook: o ódio e a ignorância como ideologias

Ódio: o lema de grande parte da direita conservadora brasileira, senão dela inteira.
Ódio: o lema de grande parte da direita conservadora brasileira, senão dela inteira.
Aviso: leia imprescindivelmente as regras de comentários do blog antes de comentar este post. Não vou poupar quem vier despejar ódio, grosseria, hostilidade e preconceito (mesmo com o disfarce de discordância) por aqui – comentários do tipo serão apagados e lamentações de quem teve comentários deletados serão ignoradas.
Nessa semana eu visitei diversas páginas brasileiras de direita conservadora do Facebook. Uma das minhas intenções era ver o que o conservadorismo brasileiro tem a oferecer de ideias e propostas de sociedade para os brasileiros em geral. Mas não achei nada que lembrasse uma vontade de promover justiça, promover o bem.
Tudo o que eu achei foi ódio. Ódio contra tudo aquilo por que a esquerda libertária luta, e também por quem é ou era militantemente de esquerda. Ódio contra a luta LGBT, contra o respeito às diferenças, contra quem luta pela igualdade, contra o ambientalismo, contra o feminismo, contra os Direitos Humanos, contra o socialismo e o comunismo (contra estes o ódio ultrapassa todos os limites de irracionalidade e fanatismo), contra a luta dos ateus por visibilidade e respeito, contra a onda nacional de protestos de junho, contra o pouquinho que existe de Estado de bem-estar social no Brasil, contra a distribuição de renda, contra a diversidade etnocultural e religiosa… contra tudo e todos que tenham como ideais a justiça, a igualdade, o progresso ético-moral, o chamado desenvolvimento social, o respeito e a paz. Só não achei ódio racial porque hoje racismo é crime no Brasil, ainda que tenha encontrado uma absurda imagem racista contra a diversidade etnocultural – que não divulguei aqui por precaução.
Mesmo políticos e partidos que abandonaram a esquerda e aderiram a um pragmatismo misto de politicamente liberal (pelo menos no que tange à privatização de bens públicos) e moralmente conservador – aliás, mesmo partidos que hoje são largamente reconhecidos como de direita – foram fulminados.
Não faltaram alianças com grupos e indivíduos fascistas, antidemocratas, ultramisóginos, fundamentalistas religiosos e homofóbicos. Outras coisas que não faltaram foram as falácias, em especial do espantalho, ad hominemnon sequitur e distorções de fato, revelando-se uma impressionante ignorância histórica e política sobre regimes ditatoriais, a natureza e os objetivos das ideologias de esquerda, a existência de corrupção em partidos e governos/regimes de direita e centro-direita (inclusos os governos de FHC em Brasília e de José Serra em São Paulo), os ideais que movem movimentos como o feminista e o LGBT, as causas da existência da pobreza, entre tantas outras coisas.
Não achei motivos ali por que eu deveria me tornar um conservador. Só achei ódio, raiva, rancor, fanatismo, mentiras, falácias, preconceito e ignorância. Cheguei perto de sentir mal estar e tontura diante de tanto ódio. Me perguntei como as pessoas que curtem ou mantêm tais páginas vivem bem de saúde física e mental – se ao menos vivem com a saúde íntegra – tendo o ódio como princípio moral.
Como frutos colhidos dessa fuçada em fanpages de direita, catei 25 imagens que são verdadeiras pérolas. Foram escolhidas por serem falaciosas, refletoras de ignorância sócio-político-histórica ou simplesmente absurdas demais. Cada uma leva os devidos comentários e teve sua origem ocultada de modo a não divulgar as páginas que eu visitei.
Felizmente tal ideário tende a se tornar cada vez menos difundido e mais repudiado. A sociedade brasileira está começando a entender que defender a conservação da ordem injusta existente é algo absurdo e o ódio não leva a nada.
Veja as 25 imagens abaixo, clicando em cada uma para vê-la em tamanho completo.

perola-antiaborto
A direita jura que embriões que sequer desenvolveram um cérebro e sistema nervoso central são capazes de pensar e manifestar desejos e intuições. Usa de falácias do espantalho (como a de que o feminismo defenderia que seria normal ou mesmo mandatório abortar fetos desenvolvidos ou mesmo próximos de nascer por qualquer motivo banal) e chantagem emocional para convencer as pessoas de que uma mórula (embrião que ainda tem o formato de um cacho de células-tronco) tem mais dignidade e direitos que, presumivelmente, uma criança já nascida que cresce numa favela. E obviamente a mulher que figura na imagem é branca – fora das imagens que negam as formas veladas de racismo e as políticas afirmativas raciais, são raríssimas as pessoas negras ou indígenas nas imagens panfletárias da direita.

perola-anarquismo-de-extrema-direita
Na cabeça de certas pessoas, a única coisa que difere esquerda e direita é o número e o peso das competências do Estado, não tendo a direita nada a ver com conservação de valores morais estagnados, ego-individualismo, naturalização das desigualdades, propriedade privada, crença numa “natureza humana” egoísta e violenta, antiprogressismo, entre tantos outros aspectos ideológicos. O absurdo da distorção do espectro ideológico é tamanho que o anarquismo, ferrenho defensor da igualdade; da liberdade ética e responsável; da soberania popular absoluta e da extinção da propriedade privada, do capitalismo e do Estado (que, segundo já dizia Max Weber, precisa do uso da violência para existir), foi considerado de extrema-direita.

perola-apologia
Não importa para conservadores que Salvador Allende tivesse sido aclamado pelo povo chileno pelo voto e um defensor do zelo da igualdade entre todos os indivíduos da sociedade pela lei. O que mais importa é que Allende era “socialista, logo um potencial ditador sanguinário e totalitário”.

perola-a-uma-mulher
Machismo, androcentrismo e homofobia são normas no conservadorismo. Tanto que a imagem acima é direcionada especificamente para homens cis heterossexuais e revela o que é o “amor/casamento tradicional” tão defendido na direita: uma relação de troca em que a mulher é uma mera máquina que troca moedas por produtos e serviços e o homem é o seu cliente e patrão ao mesmo tempo. Além disso, vale também cultuar gente que incita o ódio contra minorias e tem como objetivo a destruição dos direitos destas.

perola-a-verdade-doi
Revolta contra as injustiças da ordem social não pode, é “crime” e “vandalismo”, mas preconceito, intolerância e cerceamento dos direitos alheios, incluído o de amar, pode.

perola-bolsonazi-pena-de-morte
Ignorância social e política é lei entre quem apoia Jair Bolsonaro. Acreditam piamente que matar condenados vai inibir ou acabar com o crime, desconhecendo claramente que sempre novos criminosos hediondos vão surgir de uma ordem social desigual e cultuadora da violência e que nenhuma sociedade dotada de pena de morte conseguiu eliminar o crime pelo medo e pela execução de criminosos. Importa-lhes apenas que os crimes sejam vingados, nunca que tenham sua raiz cortada. É como quem defende que as chuvas vão deixar de cair nos vidros dos carros graças aos parabrisas.

perola-calunia-difamacao
Difamar e caluniar homossexuais, considerando-os inferiores, risíveis e indignos de direitos, pode. Denunciar publicamente a difamação e a calúnia contra eles, não. “É crime”.

perola-cotas
Non sequitur patente: por causa de três homens que vive(ra)m em três séculos diferentes, não existe nenhuma dinâmica social racista que inibe e impede que milhões de pessoas negras (incluídas também mulheres e pessoas transgêneras) alcancem altos cargos de poder no Brasil ou sequer se formem em Direito.

perola-esquerda-x-direita-2
Não basta confeccionar espantalhos ridículos da esquerda, também é de lei fazer espantalhos heroicos da direita. Completa ignorância sobre os princípios políticos e morais de ambas as metades do espectro político, um reductio ad absurdum extremamente maniqueísta. O ódio é pai da falácia, e a ignorância é sua mãe.

perola-esquerdices
No conservadorismo a esquerda é tão demoníaca que virou xingamento. Esquerdistas são feios, chatos, bobos e caras de mamão.

perola-estatuto
Na geração de quem fez essa imagem é que era bom demais. Crianças e adolescentes não tinham direitos e eram submissos à violência e ao autoritarismo dos adultos.

perola-eu-sou-reacionario
O reacionário acima defende a liberdade compartilhando imagens que defendem o fim de N liberdades. Aliás, sequer defende alguma coisa descrita na imagem (“trabalho e estudo como caminho”, “menos intervenção estatal”, “liberdade religiosa” etc.) fora seu próprio ódio contra as mudanças sociais. Entendedores entenderão.

perola-feliciano-x-wyllys
Defensores de Marco Feliciano: usam falácia de apelo à multidão e esquecem que Feliciano ofendeu milhões de mulheres, negros, afrorreligiosos, homossexuais, pagãos e católicos.

perola-feminismo
O espantalho que fazem do feminismo é melado de sangue. Dizem que o feminismo prega “ódio e misandria” ao mesmo tempo em que incitam o ódio contra feministas. Qualquer semelhança com as charges misóginas contra as sufragettes (defensoras do direito feminino ao voto que militaram nos séculos 19 e 20) não é mera coincidência.

perola-humanofobia
Porque ser um humano é motivo de preconceito, discriminação e crimes de ódio. Opressões de gênero, de raça, de orientação sexual, de (ir)religião, de idade etc. non eczistem, e ser um crime de ódio não deveria ser considerado agravante de crimes contra a vida e a integridade físico-psicológica. Assim acreditam os homofóbicos e machistas.

perola-intervencao-militar
Contra uma “ameaça” imaginária, supressão da democracia já! O nazi-fascismo idealizador de “inimigos nacionais” mandou lembranças.

perola-levante-se
PSDB, PMDB, PR E PSD COMUNISTAS!!!!111!onze!11um!!!1 Extrema-direita: sentir medo ou rir?

perola-maconha
Fumar maconha não! Beber até cair e agredir e matar pessoas bêbado sim!

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Certas pessoas delirariam se fosse criado o Partido Antissocial Antipopular Antitrabalhista Brasileiro.

perola-preta-gil
 Para depreciar quem defende justiça e igualdade, vale fazer comparações esdrúxulas, machistas e criminosamente difamatórias entre um inimigo dos Direitos Humanos e uma cantora defensora dos mesmos. Aviso: Caso Preta Gil queira processar o autor dessa imagem por difamação, sinta-se à vontade – fonte da imagem. Sinta-se à vontade também, Preta, de requisitar que o Consciencia.blog.br apague a imagem acima caso ache melhor.

perola-quer-mudar-o-brasil
Pessoas que desejam conservar a ordem das coisas e impedir mudanças falam em “mudar” o Brasil e listam coisas que não fazem nada para defender fora expelir ódio verbal contra a esquerda e os partidos ex-esquerdistas.

perola-revolucionario-x-reacionario
Divulgar o que a esquerda realmente pensa é “doutrinação ideológica”. Divulgar espantalhos da esquerda e divinizar a direita e seus valores não é. Coerência faz falta por aqui.

perola-serra-x-haddad
Certos militantes de direita têm crenças que deixariam crianças pequenas envergonhadas.

perola-sexo-que-precisa-de-protecao
Porque os homicídios, suicídios e atropelamentos de homens são causados pela opressão “femista”, “misândrica” e “ginocêntrica” promovida pelas mulheres. Mulheres “femistas” matam ou atropelam homens e induzem homens ao suicídio a cada minuto – dá para levar isso a sério? E a proposta aqui é proteger o homem… dele mesmo?

perola-socialismo-x-capitalismo
Capitalismo, onde filas de pães esperam por você. Exceto se você fizer parte dos bilhões de seres humanos que não têm condição de comprar filas de pães na padaria graças à desigualdade promovida pelo capitalismo.

domingo, 1 de setembro de 2013

Globo: o odor da saturação

Não se sabe ainda se há relação de causalidade entre uma coisa e outra.

O fato é que manifestantes do Levante Popular guarneceram a sede da Globo em SP, neste sábado (31), com fezes. A retribuição, em espécie, dizem os integrantes do protesto, remete ao conteúdo despejado diuturnamente pela emissora nos corações e mentes da cidadania brasileira.

Apenas algumas horas depois, uma nota postada no site do jornal ‘O Globo’ manifestava o arrependimento da corporação pelo editorial de 2 de abril de 1964, de apoio ao golpe que derrubou Jango e instalou, por 21 anos, uma ditadura militar no país (Leia os dois textos ao final desta nota).

Se a matéria-prima do protesto motivou a purgação é imponderável.

Mas por certo a recíproca é verdadeira.

O fecalismo voador de que foi alvo o edifício-sede das Organizações Globo na capital paulista é decorrência da ação coesa, contínua, não raro beligerante, que o maior grupo de mídia do país tem dispensado contra ideais e forças progressistas do país.

A nota deste sábado é histórica.

Mais pela evidência da mudança na correlação de forças que obriga a emissora a se desfazer de um legado incomodo, do que pelo arrependimento que simula.

Na verdade, nem simula direito.

A nota faz malabarismo, tergiversa e mente para justificar o golpe que apoiou ostensivamente.

No fundo, apenas lamenta ter sido tão desabrida, como se não houvesse amanhã.

O amanhã chegou.

Seja na forma de matéria fecal, protestos massivos, redes alternativas de informação, desqualificação ética, queda de audiência e desprestígio editorial.

O fato é que há na sociedade um discernimento crescente em relação aos verdadeiros propósitos e interesses que movem o noticiário, as campanhas e perseguições movidas pelas Organizações Globo contra projetos, direitos, governos, lideranças e partidos.

A Globo foi e é parte diretamente interessada no assalto ao poder que interrompeu a democracia brasileira em março de 1964.

Não se trata de um editorial isolado, como tenta edulcorar a nota deste sábado.

Testemunha-o o acervo de 49 anos de pautas golpistas depois do golpe.E décadas de idêntico engajamento pré-64.

Ou terá sido coincidência que, em 24 de agosto de 1954, consternado com a notícia do suicídio de Vargas, o povo carioca perseguiu e escorraçou porta-vozes da oposição virulenta ao Presidente; cercou e depredou a sede da rádio Globo, que saiu do ar?

O mesmo cerco que levaria Vargas ao suicídio, asfixiou Jango, dez anos depois.

Foi da mídia (a Globo na comissão de frente), a iniciativa de convocar o medo, a desconfiança, o linchamento das reputações que levariam uma parte da classe média a apoiar o movimento golpista.

Mente a nota ‘arrependida’, ao afirmar, citando Roberto Marinho, em 1984: “os acontecimentos se iniciaram, como reconheceu o marechal Costa e Silva, ‘por exigência inelutável do povo brasileiro’. Sem povo, não haveria revolução, mas apenas um ‘pronunciamento’ ou ‘golpe’, com o qual não estaríamos solidários.”

Quem inoculou o terror anticomunista na população, de forma incessante e sem pejo?

Quem gerou o pânico e, a contrapelo dos fatos, martelou a tecla de um governo isolado e manipulado ‘pelo ouro de Moscou’?

O acervo do Ibope, catalogado pelo Arquivo Edgard Leuenroth, da Unicamp, reúne pesquisas de opinião pública feitas às vésperas do golpe.

Os dados ali preservados foram cuidadosamente ocultados pela mídia no calor dos acontecimentos e por décadas posteriores.

Agora conhecidos, ganham outro significado quando emoldurados pela atuação do aparato midiático ontem – mas hoje também.

Enquetes levadas às ruas entre os dias 20 e 30 de março de 1964, quando a democracia já era tangida ao matadouro pelos que bradavam a sua defesa em manchetes e editoriais, mostram que:

a) 69% dos entrevistados avaliavam o governo Jango como ótimo (15%), bom (30%) e regular (24%). Apenas 15% o consideravam ruim ou péssimo, fazendo eco dos jornais.

b) 49,8% cogitavam votar em Jango, caso ele se candidatasse à reeleição, em 1965 (seu mandato expirava em janeiro de 1966); 41,8% rejeitavam essa opção.

c) 59% apoiavam as medidas anunciadas pelo Presidente na famosa sexta-feira, 13 de março.

Em um comício que reuniu então 150 mil pessoas na Central do Brasil (o país tinha 72 milhões de habitantes), Jango assinou decretos que expropriavam as terras às margens das rodovias para fins de reforma agrária; e nacionalizou refinarias de petróleo.

As pesquisas sigilosas do Ibope formam apenas o desnudamento estatístico de um jornalismo que ocultou – e oculta – elementos da equação política quando se trata de sabotar as aspirações progressistas da sociedade; convocou e convoca, exortou e exorta, manipulou e manipula, incentivou e incentiva o complô, a manobra, a desqualificação, ao cassação e, no limite, o golpe.

Em defesa dos mesmos interesses que fizeram 64.

O editorial ‘O Renascimeto da Democracia’, de que se arrepende a empresa ora guarnecida com resíduo fecal, não foi um ponto fora da curva. Mas o curso natural de um engajamento histórico.

Não se deduza disso que a democracia brasileira vivia em 1964 mergulhada na paz de um lago suíço.

Num certo sentido, vivia-se, como agora, o esgotamento de um ciclo e o difícil parto do novo.

Uma parte da sociedade – majoritária, vê-se agora pelos dados escondidos no acervo do Ibope – considerava no mínimo pertinente o roteiro de soluções proposto pelas forças progressistas aglutinadas em torno do governo Jango.

As reformas de base – a agrária, a urbana, a fiscal, a educacional — visavam destravar potencialidades e recursos de um sistema econômico exaurido.

Jango pretendia associar a isso um salto de cidadania e justiça social.

O que importa reter aqui, como traço de atualidade inescapável, é o comportamento extremado do aparato midiático diante desse projeto.

Convocada a democracia e a sociedade a discutir o passo seguinte da história brasileira, os campeões da legalidade de ontem e de hoje optaram pelo golpe.

Deram ao escrutínio popular um atestado de incompetência política para formar os grandes consensos indispensáveis à emergência de um novo ciclo de desenvolvimento com maior justiça social.

Não há revanchismo nesse retrospecto.

Pauta-o a necessidade imperativa de dotar a democracia brasileira das salvaguardas de pluralidade midiática e participação social que a preservem da intolerância conservadora.

Aquela que em 54 matou Getúlio.

Em 1964, negou à sociedade a competência para decidir o seu destino.

Em 2002 fez terrorismo contra Lula.

Em 2005 tentou derrubá-lo e impedir a sua reeleição em 2006.

E assim se sucede desde 2010, contra Dilma.

A exemplo do que se assiste agora contra o PT e suas lideranças, ao mesmo tempo em que se exacerba a gravidade dos desafios econômicos na manipulação das expectativas dos mercados.

Veiculado pela família Marinho dois dias depois do golpe, o editorial do Globo, não foi um ponto fora da curva.

Ele consagra um método.

Que a experiência recente não pode dizer que caiu em desuso.

Mas que vive um ponto de saturação.

Ilustra-o a necessidade de mostrar arrependimento.

Bem como o sugestivo odor exalado das paredes da sede da Globo em São Paulo.

O arrependimento simulado serve também como admissão de culpa.

De quem moveu a alavanca da derrubada de um governo democrático. Mais que isso: legitimou, ocultou e se esponjou nas vantagens obtidas junto a um regime que recorreu à tortura e ao assassinato contra opositores.

Cabe à Comissão da Verdade fazer desse 'arrependimento' um verdadeiro ato de justiça. E convocar a Globo a depor perante a Nação.
Por Saul Leblon